Por Lucas Figueiredo /
Em “O Esquema Fenício”, Wes Anderson nos entrega mais uma comédia peculiar sobre famílias excêntricas e disfuncionais, um tema recorrente em sua filmografia. Desta vez, o bilionário Zsa-Zsa Korda (Benicio del Toro), um sobrevivente de seis acidentes aéreos e pai de nove filhos homens, surpreende ao eleger sua única filha, a freira Liesl (Mia Threapleton), como herdeira. Ele a incumbe de uma missão global para concretizar seu ambicioso projeto: o “Korda Land and Sea Phoenician Infrastructure Scheme”. Acompanhada do ingênuo tutor Bjorn (Michael Cera), Liesl e seu pai viajam o mundo, negociando com empresários, empreiteiros e até figuras criminosas, tudo isso enquanto ocultam seus verdadeiros objetivos.
A marca visual de Wes Anderson é inegável e facilmente identificável em todas as suas obras. Em “O Esquema Fenício”, ele segue rigorosamente suas fórmulas estéticas milimétricas, mas com um toque adicional. O filme surpreende com um início enérgico e ágil, algo diferente para os padrões do diretor. Essa abordagem imediata nos engaja e gera curiosidade sobre as aventuras do protagonista e os motivos por trás das tentativas de assassinato contra ele. Os personagens centrais, incluindo os companheiros de aventura, são introduzidos sem grandes arcos narrativos adjacentes, resultando em uma história mais linear e focada exclusivamente nessa peculiar família.
Apesar do início promissor, o ritmo do filme sofre no decorrer da trama. O segundo ato se torna arrastado e até repetitivo, pois a necessidade de passar por diversos locais ao redor do mundo, com antagonismos burocráticos sempre apresentados da mesma forma, faz com que o ritmo caia. Se não fosse pelas situações cômicas e o carisma dos personagens, o filme poderia facilmente se tornar superficial. E,de fato, os personagens são a força primordial deste projeto. O trio de protagonistas carrega segredos de seu passado que são gradualmente revelados ao longo da trama. Embora os desenvolvimentos não sejam excessivamente complexos, seus traumas e remorsos se encaixam bem nas situações que enfrentam. Ainda que mantenhamos uma certa distância como espectadores, sentimos empatia e interesse em acompanhá-los.
A comédia em “O Esquema Fenício” é predominantemente visual, com piadas e situações físicas, como uma desajeitada partida de basquete ou a birra de um adulto. É interessante notar como o estilo único de Wes Anderson, conhecido por seus padrões formais exacerbadamente calculados, parece se desprender um pouco em favor de enquadramentos mais dinâmicos e fluidos. A câmera busca a ação do personagem, em vez de limitá-lo ao quadro, o que representa uma mudança interessante e pode até causar estranhamento nos fãs mais antigos do diretor.
Em termos de direção de arte, “O Esquema Fenício” apresenta uma paleta de cores menos vibrante e saturada que seu filme anterior, “Asteroid City” (2023). Predominam tons verdes e azuis, com o amarelo pastel surgindo em momentos pontuais. Essa escolha combina com o tom mais “pé no chão” do filme, apesar dos elementos exagerados. A arte aqui busca evidenciar aspectos mais simples do cotidiano dos personagens, em vez de elementos irreais ou adereços extravagantes. As belas maquetes vistas em “Asteroid City” e “A Crônica Francesa” dão lugar a cenários mais fechados e introspectivos.
Por fim, “O Esquema Fenício” representa o melhor e o pior da cinematografia de Wes Anderson. Não há grandes novidades, e sua fórmula é reprisada com a mesma estrutura narrativa de sempre para os personagens. O diferencial talvez resida no timing cômico e na despretensão que funcionam muito bem. É um filme de comédia e aventura sobre família que se diverte e pode ser assistido em família. Mesmo no “piloto automático”, Anderson ainda consegue criar uma história interessante e agradável de se ver, ainda que distante de suas obras mais consagradas.
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