Por Kian Zwicker /

Me Ame Como É Pra Amar, curta-metragem dirigido e escrito por Lucas Blanco, aborda de forma íntima e sensível as diversas formas de amor. Lucas, egresso do curso de Cinema e Audiovisual da UFPA, constrói uma narrativa que explora os desafios da aceitação e os impactos do luto dentro de uma família. A trama acompanha Nicolas, um jovem que, após a morte de sua mãe, tenta lidar com a rejeição do pai ao descobrir sua homossexualidade. Em paralelo, o filme toca em outras camadas emocionais, como a busca de Nicolas por afeto e o reflexo da ausência de amor paterno em seus relacionamentos.
O curta não foge de temáticas que, apesar de universais, ainda encontram resistência em muitos espaços. A relação conflituosa entre Nicolas e o pai reflete o preconceito presente em muitas famílias e questiona os limites do amor paternal. Afinal, até onde vai a ignorância de quem, ao invés de apoiar, acaba afastando quem ama? Por que um pai que se diz amoroso vira as costas ao descobrir algo tão essencial sobre o filho? Além disso, o curta articula a interseção entre luto e preconceito, sugerindo que, sem a mãe – a ponte afetiva entre pai e filho -, o relacionamento entre os dois entra em colapso.
Esses conflitos não são apenas familiares, mas sociais. O filme também aponta como a ausência de aceitação pode moldar a maneira como alguém enxerga e vive o amor em outras relações. Ao conectar luto, preconceito e vulnerabilidade, Me Ame Como É Pra Amar convida o espectador a refletir sobre o impacto emocional dessas questões em quem apenas busca ser aceito.
O maior mérito do filme está na escolha de um tema tão necessário e no impacto que ele gera ao ser exibido em eventos como a Mostra Audiovisual LGBTQIAPN+ do Amazônia em Rede. A exibição em espaços como a Usina da Paz Jurunas/Condor é um exemplo de como o cinema pode quebrar bolhas e dialogar com públicos mais amplos, gerando empatia e questionamentos.
A iniciativa das Usinas da Paz, promovida pelo governo para democratizar o acesso à cultura e ao entretenimento a bairros periféricos e de perfil mais familiar, amplia ainda mais o alcance do filme. Ao ser exibido nesse espaço, Me Ame Como É Pra Amar alcança espectadores que, talvez, não estivessem acostumados a consumir narrativas LGBTQIAPN+. Essa oportunidade de contato com novas perspectivas é fundamental para criar um diálogo mais diverso e inclusivo.
Uma das cenas mais fortes do curta é o diálogo em que Nicolas se assume para o pai. Simples nas palavras, mas intensa na carga emocional, a cena encapsula o conflito central do filme. A frase “Eu não vou mudar, pai. Eu sou gay! E eu preciso do meu pai de volta.” sintetiza não apenas a dor de Nicolas, mas também a realidade de tantas pessoas da comunidade LGBTQIAPN+. É um momento que, mesmo curto, ecoa muito além da tela, tocando quem já viveu algo semelhante ou quem, talvez, precise repensar suas próprias posturas.
Por outro lado, é na parte técnica que o filme encontra alguns tropeços. A trilha sonora, embora mereça elogios por ser inteiramente autoral, apresenta momentos de desconexão. O curta utiliza diversas músicas ao longo de sua duração, mas, por vezes, parece não haver tempo suficiente para que todas elas se encaixem naturalmente na narrativa. Isso resulta em transições abruptas, que podem tirar o espectador da imersão.
A colorização também apresenta problemas, especialmente na transição entre as cenas que retratam o período em que a mãe está viva e o momento após sua morte. O uso de tons quentes para simbolizar vida e conforto fica exagerado, quase caricato, enquanto os tons frios funcionam melhor, mas poderiam ser trabalhados com mais sutileza.
Outro detalhe técnico que chama atenção está na cena inicial, quando os pais de Nicolas dançam na cozinha. Os feixes de luz, que deveriam criar uma atmosfera acolhedora, acabam parecendo efeitos mal aplicados, tirando um pouco da naturalidade do momento.
Além disso, embora alguns diálogos sejam extremamente marcantes e carreguem um peso emocional significativo, a maioria deles soa estranha na execução. Existe uma falta de naturalidade, como se esses diálogos funcionassem melhor no papel do que na fala e atuação. Isso provoca uma sensação de artificialidade, que em certos momentos quebra a imersão do espectador na narrativa. Esses problemas, apesar de não comprometerem completamente o filme, mostram que há espaço para amadurecimento técnico e refinamento na direção de atores e na adaptação do texto para a tela.
Me Ame Como É Pra Amar é um filme que se destaca por sua coragem e relevância. Lucas Blanco entrega uma obra que dialoga diretamente com as dores e desafios da comunidade LGBTQIAPN+, mostrando como o cinema universitário pode abordar temas urgentes e promover diálogos transformadores.
Ao se inserir em um contexto tão importante como o da representatividade no audiovisual, o filme cumpre seu papel social ao alcançar públicos diversos e fomentar a empatia. Para quem assiste, a história de Nicolas é um convite a refletir sobre as complexidades do amor e as consequências do preconceito. Para o cineasta, o curta evidencia um grande potencial narrativo, mas aponta a necessidade de um maior cuidado técnico. Mesmo com seus aspectos a refinar, o curta demonstra que o cinema não precisa ser impecável para emocionar. Pelo contrário, são as vulnerabilidades da produção, e dos próprios personagens, que tornam Me Ame Como É Pra Amar uma experiência tão sincera e humana. É um trabalho que merece reconhecimento e que deixa claro o papel do cinema universitário como espaço de resistência, reflexão e transformação.
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